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Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros
          querida  da própria  Dona Arinha,  e  a  casa  senhorial  daquela fazen-
          da  que   tinha de tudo e hoje, como disse, é um pardieiro.   Ali   ela
          reinou  com dignidade  e  espírito  benfazejo,  cercada  do  carinho  e
          do respeito de todos os seus  e daqueles   que recebia  com distinção,
          deixando saudades, muitas  saudades.
               Essa narrativa do Ponciano, tão sugestiva, dando-nos tanto  que
          pensar,  fez-me lembrar o que li algures. Certa feita,  em Bolonha, na
          Itália,  um pintor de paredes, contemplando  a “Santa Cecília” -  uma
          tela de Rafael, ficou extasiado, vindo a exclamar diante  das pessoas
          presentes:  Anch´io sono pittore... (Eu também sou pintor).

               Pois então, tenho também as minhas reminiscências  do tempo
          de criança e, por minha vez,  lembro-me ,   com muita  saudade,  da
          querida  madrinha Carlota,  e da fazenda da Estiva, em São João do
          Paraíso,  no município de Rio Pardo,  onde ela morava.  Casada  com
          meu avô materno,  Matteo Salviolo, natural de  San Pietro al Tana-
          gro, província de Salerno-Itália, ficando viúva, casou-se, em segundas
          núpcias,  com o viúvo Major Joaquim Pedro de Almeida, da Guarda
          Nacional, que foi meu padrinho e do qual  eu tanto gostava.

                O velho  Matteo, que não conheci em vida,  fez da Estiva  o
          Eldorado  onde passávamos as férias. Viajando a cavalo, íamos de
          Espinosa, passando  por Agua Quente, hoje  Montezuma, onde  per-
          noitávamos e tomávamos delicioso banho nos poços tépidos e borbu-
          lhantes.

               A duras  penas, vencendo em dois dias um estirão de vinte lé-
          guas  bem puxadas, por  estradas horríveis, com sol ou com chuvas,
          chegávamos  na  Estiva esbodegados, com a bunda esfolada na sela,
          ainda que forrada por coxinilho,  mas felizes, recompensados  de  to-
          das  as  canseiras, pois  ali  desfrutávamos  de  verdadeiro  paraíso.
               A fazenda tinha de tudo, era auto-suficiente.  À frente da casa
          havia um roseiral de  espécies  raras, com  enxertos   de vários matizes.
          Um encanto.  No oitão, do lado direito, fechada por uma cerca de

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