Page 19 - DEUSA DAS LETRAS
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A Deusa das Letras


              recorda que, quando começou a se popularizar o uso de drogas,
              escreveu uma crônica contundente sobre o tema, condenando,
              obviamente, e foi duramente ameaçada. Na ocasião lecionava e
              dirigia, e sob um alerta dos riscos que corria, decidiu abandonar
              assuntos polêmicos.
                    Diante de uma dama centenária, mesmo quem não se im-
              porta com o politicamente correto, tende a derramar-lhe elogios
              fáceis. Espírito crítico: está aí uma qualidade que Dona Yvonne
              Silveira tem de sobra. Rigorosa sobre o que diz, quando discursa
              e troca algum nome, põe-se a fazer o mea culpa, lamentando-se
              pelo equívoco.

                    É de se esperar enorme comedimento de quem veio ao
              mundo no começo do século passado. Nasceu em Montes Cla-
              ros em trinta de dezembro de 1914, filha de um farmacêutico
              bem conceituado, que, devido à prática de curar doentes naque-
              les lugares ermos em que não havia médico, chegou a passar di-
              cas para profissionais formados na capital. Nos seus catorze anos
              a família foi morar em Francisco Sá, chamado Brejo das Almas,
              lugar com quatro ruas poeirentas. Um rapaz, Olyntho Silveira,
              então com dezenove anos falou que iria namorar a filha do dono
              da farmácia. Tinha visto a menina uma vez e quando a viu de
              novo, ela própria já sabedora do seu interesse, passou diversas
              vezes de bicicleta, vestido num paletó marrom, e com a gola da
              camisa aparecendo.

                    Namoraram quatro anos, e, seguindo a tradição da época,
              pensou que, com um beijo na boca, fato consumado e que mui-
              to a impressionou, ficaria grávida. Era a filha mais velha, e a mãe
              adoentada, com problema psiquiátrico, que não tinha tratamen-
              to eficaz, não lhe falou nada sobre casamento. Utilizou-se das in-


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